terça-feira, 21 de setembro de 2010

Paulo Freire, Elementos do seu método

O método construído por Paulo Freire a partir de sua prática pedagógica, em articulação com os carentes sociais e culturais de seu estado de Pernambuco, gerou um programa de alfabetização que marcou as quatro últimas décadas do século 20. Pode-se dizer que esse método interferiu no mundo da educação em todos os continentes.

Partindo de "temas geradores", o método propiciava uma reflexão do alfabetizando sobre os seus próprios problemas - o que gerava necessidade de posicionar-se sobre tais questões e de expressá-las em formas próprias de comunicação. Com o método de Freire, os adultos não se sentiam alheios aos temas de sua escrita e a leitura virava um aprofundamento do que já vinham vivendo, em suas experiências como trabalhadores e cidadãos.

Se os temas geradores fossem, digamos, terra, latifúndio, favela, enxada, foice, casa, eram essas as palavras a serem lidas e escritas, com seus significados debatidos. Toda a gama de desmembramento de outras palavras era oriunda dessas sílabas componentes das palavras-temas. FA-VE-LA pode gerar: vê-la, fa-la, La-ve, lu-va, fa-va, etc., assim como outras inúmeras composições com seus diversos grupos silábicos, num imenso repertório de possibilidades. Com isso, os jovens ou adultos constroem palavras nascidas de seu repertório "gerador"; e sendo elas debatidas, escritas e faladas, podem transformar as suas realidades pela práxis.

Os problemas de alfabetização não pararam aí: da perspectiva do método, o desafio contemporâneo é continuar a construir, com os leitores-aprendizes,a problematização sobre os temas geradores em cada nova realidade - como no mundo digital, especialmente.

Tornado realidade pela reorganização do capitalismo volátil, o mundo digital deve ser também objeto de um novo processo de alfabetização. O mundo digital em nada é menos opressor ou menos desumanizador que o mundo do latifúndio ou da favela. São desafios mais sutis e mais encobertos em aparências de globalização democrática. Como Paulo Freire pode ser chamado para ajudar a desenhar um método de alfabetização crítico-digital?

Para estar nesse mundo e poder participar de suas potencialidades é preciso dominá-lo. Este domínio não se dará pelo controle simples de seus manuais de instrução ou pela manipulação de seus teclados e softwares - "caminhar sobre as letras", como dizia Freire.

Tal participação demanda um aguçamento do senso crítico, acompanhando a discussão de seus problemas e de suas perspectivas. Este domínio se desenvolve também com a compreensão de seus instrumentais: navegar na internet, trabalhar com um processador para escrever um texto, poder enviar uma mensagem para o outro lado da cidade ou do mundo, criar uma agência de notícias ou editar jornais comunitários, divulgar seu currículo na rede: tudo isso pode ser um caminho freiriano de uso crítico e político.

Fonte: Folha de SP

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